O artista visual Zé
de Rocha se prepara para mais uma exposição individual, em meio a um embrolho
cultural. Entre os dias 19 de junho e 28 de julho, os primeiros resultados da
série sangue-ígneo, produzidos com as "espadas de fogo" de Cruz das
Almas chegam as paredes da galeria RV Cultura e Arte, ao mesmo tempo em que o Ministério
Público fecha ainda mais o cerco em torno da "Guerra de espadas" da
região.
Proibida desde 2011
na cidade, a fabricação ou queima da espada coloca o artista em um intenso fogo
cruzado. Se por um lado o Ministério Público não abre mão da proibição,
sustentando que a medida visa diminuir a quantidade de vítimas de queimaduras
durante o São João, por outro, boa parte da população defende a continuidade da
tradição popular, propondo que se estabeleçam regras para o fabrico e a queima
do artefato, e pedidindo registro da festa como Patrimônio Cultural.
Nascido e criado em
Cruz das Almas, Zé de Rocha parece construir em suas obras um relato rico da
questão. Sua iconografia revela a violência das espadas, através das marcações
feitas em tela, e o risco de utilizar o próprio artefato - quando se
auto-retrata como espadeiro, o artista reproduz a paramentação de quem se
arrisca na brincadeira. Mas ao mesmo tempo está também ali estampado o caráter
performático e lúdico do "tocar espadas", sugeridos pelo movimento
contínuo das linhas e a composição ampliada das imagens.
Para além das
questões estéticas, no entanto, a série sangue-igneo reúne ainda impressões
sobre a tradição e a importância cultural das festas juninas. Se a fabricação
artesanal das espadas de Cruz das Almas é uma arte que atravessa gerações,
conhecimento passado de pai para filho, a origem do festejo para São João com
fogos de artifício, popular e pagão, remonta a costumes comuns também na
Espanha e em Portugal, ou seja, fazem parte das muitas matrizes culturais
brasileiras.
Artista
fora-da-lei, o que Zé de Rocha propõe ao espectador é um deslocamento. Quem
observa a obra é convidado a perceber a intensidade plástica de cada trabalho,
alheio a imposições jurídicas e desprendido da referência popular. Se o
Ministério Público irá voltar atrás e liberar a tradição das espadas não há
como afirmar, mas certamente Zé de Rocha inicia uma nova batalha no cenário da
"Guerra de espadas".
3 comments:
Vejo o trabalho exposto como uma grande homenagem ao município de Cruz das Almas que hoje tem seu patrimônio cultural, a guerra de espadas, à beira da extinção.
Eu ensinar arte por muitos anos. Eu sempre trabalhei em estúdios, mas estou a pensar abrir o meu próprio lugar. Estou pensando em alugar uma casa em rocha, porque é um lugar onde há muitos jovens que gostam de arte e expressão.
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